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Poeta - escritor - cronista - produtor cultural. Professor de Português e Literaturas. Especialista em Estudos Literários pela FEUC. Especialista em Literaturas Portuguesa e Africanas pela Faculdade de Letras da UFRJ. Mestre e Doutor em Literatura Portuguesa pela UFRJ. Nascido em Goiás, na cidade de Rio Verde. Casado. Pai de três filhos.

sábado, 17 de março de 2012

Crônica: Quentinha de Sorvete - Erivelto Reis

                                                  QUENTINHA DE SORVETE
                                                                                         Erivelto Reis



Meu coração parece uma quentinha de sorvete: se derrete por qualquer ato de calor humano. A generosidade me alegra. O respeito me inspira. O amor me enleva. O carinho me emociona. Gente educada me fascina. Amizades sinceras me motivam. Quem sabe se comunicar me encanta. A beleza da bondade, da delicadeza e da arte se entranha nas almas como um “perfume esquizofrênico”, indefinido, mas reconheço seu cheiro por onde quer que eu passe.

Gosto de saber que há palavras ditas em horas precisas e inesquecíveis. Um “bom dia”, um “por favor,”, um “obrigado”, um “eu te amo”, um “até logo”... desde que seja sincero. É só o que espero. Gosto de acreditar que há um jeito de tocar, de segurar na mão, que parece dizer que a ventania vai passar. Gosto de saber que meu amor me ama até com o olhar. Me derreto mesmo. Me derreto muito. Me derreto todo.

É certo que, pra muita gente, a vida tem sido madrasta, tem sabor amargo, tem sido trágica, hemorrágica. Sei que há dificuldade, tristeza, dissabor, desigualdade. Que a vingança é um prato vazio que se come cru e frio. Afirmar não posso, mas desconfio que há um treino, um ensaio. Um olhar de soslaio pras coisas boas da vida enquanto ainda não estão escolhidas, embaladas e nos são enviadas. O mais é conversa, peripécia, peça de oratória que confunde tanto, que confunde mesmo, que confunde muito.

Assim, há quem diga que a lágrima é dor construída, líquida, vária, crônica e esporádica, por quem pena por ter pena de pensar em dó. A lágrima é a foz do rio de quem vive só. É ansiedade repartida e refletida no peso de quem fica com a tonelada, quem leva pisada, carrinho e falta no jogo da vida. Saber disso me faz chorar mesmo, chorar muito... chorar tanto.

As conquistas, as emoções positivas, vividas ou testemunhadas, também fazem do meu coração uma quentinha de sorvete. Mas não é só comigo. Outras pessoas talvez entendam o que eu digo. O coração de um pai que conduz a única filha ao casamento, num sagrado altar, e que, depois de receber um agradecimento em uma pista de dança, começa a chorar, é uma quentinha de sorvete. O coração de uma mãe assistindo os seus filhos que jogam futebol num campinho improvisado, na lateral de casa, ou que busca a filha, linda e talentosa, na Universidade, é uma quentinha de sorvete. Consideração, lembrança no aniversário, homenagem, presente desinteressado, aplauso, poemas descobertos ao acaso e memorizados, são quentinhas de sorvete. Me emocionam muito, emocionam tanto, emocionam mesmo.

Queria que mais emoção, valor e consideração fizessem com que os corações das pessoas transbordassem de felicidade. Fossem componentes de belas histórias. Queria que cada ruga, linha de expressão, cabelo branco ou olheira fossem índices de vitórias. Epígrafes de glórias. Belas trajetórias. Queria isso para muitas vidas, para a minha vida toda. Para a minha vida mesmo. Queria isso pra você também. Um coração caloroso e feliz: tal qual quentinha de sorvete, pulsando, batendo, sem susto, sem despedida... e as pessoas saboreando a Fraternidade, o Amor e a Esperança: o derretido néctar do napolitano sorvete que adoça a vida.

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